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segunda-feira, 24 de novembro de 2025

CRIME TRIBUTÁRIO ANTES DA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO

 





Marco Aurélio Bicalho de Abreu Chagas



A Súmula Vinculante nº 24 do STF reza:

Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo.”

O precedente representativo está nos seguintes termos: Embora não condicionada a denúncia à representação da autoridade fiscal (ADI 1.571 MC), falta justa causa para a ação penal pela prática do crime tipificado no art. 1º da Lei 8.137/1990 — que é material ou de resultado —, enquanto não haja decisão definitiva do processo administrativo de lançamento, quer se considere o lançamento definitivo uma condição objetiva de punibilidade ou um elemento normativo de tipo. 2. Por outro lado, admitida por lei a extinção da punibilidade do crime pela satisfação do tributo devido, antes do recebimento da denúncia (Lei 9.249/1995, art. 34), princípios e garantias constitucionais eminentes não permitem que, pela antecipada propositura da ação penal, se subtraia do cidadão os meios que a lei mesma lhe propicia para questionar, perante o Fisco, a exatidão do lançamento provisório, ao qual se devesse submeter para fugir ao estigma e às agruras de toda sorte do processo criminal. [HC 81.611, rel. min. Sepúlveda Pertence, P, j. 10-12-2003, DJ de 13-5-2005.]

A Jurisprudência do STF tem se firmado no seguinte sentido:

Em princípio, atesto que a decisão definitiva do processo administrativo consubstancia condição objetiva de punibilidade. Em outras palavras, não se pode afirmar a existência, nem tampouco fixar o montante da obrigação tributária até que haja o efeito preclusivo da decisão final administrativa. Vale ressaltar que, a partir do precedente firmado no HC 81.611/DF, firmou-se nesta Corte jurisprudência no sentido de que o crime contra a ordem tributária (art. 1º, I a IV, da Lei 8.137/1990) somente se consuma com o lançamento definitivo. É que, em razão da pendência de recurso administrativo perante as autoridades fazendárias, não se pode falar de crime. Uma vez que essa atividade persecutória funda-se tão somente na existência de suposto débito tributário, não é legítimo ao Estado instaurar processo penal cujo objeto coincida com o de apuração tributária que ainda não foi finalizada na esfera administrativa. [HC 102.477, voto do rel. min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. 28-6-2011, DJE 153 de 10-8-2011.]

Recentemente a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ resolveu, no exame de um caso concreto, admitir a ação por crime tributário antes da constituição do crédito.

O Ministro Relator considerou possível o afastamento da Súmula Vinculante nº 24 em casos em que há embaraço à fiscalização tributária e o cometimento de outros crimes.

A mitigação da Súmula Vinculante 24 do STF ocorre em casos excepcionais, quando há indícios da prática de outros crimes de natureza não tributária conexos à sonegação, como corrupção, organização criminosa ou lavagem de dinheiro. Nessas situações, a ação penal pode ser permitida mesmo antes do lançamento definitivo do tributo, pois os crimes não tributários não dependem dessa condição de punibilidade. Outra exceção é quando o embaraço à fiscalização é flagrante ou quando o lançamento definitivo ocorre durante a tramitação do processo. 

A mitigação é uma exceção à regra da mencionada súmula, permitindo que a persecução penal continue antes do lançamento definitivo em circunstâncias específicas.

A mitigação é permitida quando o crime tributário é apenas um dos delitos investigados, e existem indícios de outros crimes, como corrupção ou organização criminosa. Em tais casos, a investigação e denúncia dos crimes não tributários podem seguir, mesmo que a investigação do crime fiscal ainda esteja pendente de lançamento definitivo.

Também quando a conduta investigada dificulta ou impede a fiscalização tributária é uma situação que autoriza a mitigação.

Ante as peculiaridades do caso concreto mostra-se admissível a mitigação da Súmula Vinculante mencionada, a exemplo dos seguintes julgados, à guisa de ilustração:

Sobressai da narrativa dos agravantes que “são investigados outros crimes além dos tipificados no 'art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/1990', dentre eles, crimes contra a administração em geral e de "lavagem" ou ocultação de bens, direitos e valores”, sendo certo o entendimento sufragado por esta Corte no sentido da prescindibilidade do esgotamento das vias administrativas para a investigação do crime de lavagem de dinheiro, conquanto o crime antecedente possa se consubstanciar em crime material contra a ordem tributária, mostrando-se possível a mitigação do enunciado 24 da Súmula Vinculante do Supremo Tribunal Federal na hipótese da investigação de crimes cuja natureza é distinta da fiscal. Precedentes: HC 118.985 AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Edson Fachin, DJe de 21/06/2016; e ARE 936.653 AgR, Primeira Turma, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 14/06/2016.[Rcl 28.147 AgR, rel. min. Luiz Fux, 1ª T, j. 28-11-2017, DJE 80 de 25-4-2018.]


Os crimes contra a ordem tributária pressupõem a prévia constituição definitiva do crédito na via administrativa para fins de tipificação da conduta. A jurisprudência desta Corte deu origem à Súmula Vinculante 24 (...). 2. Não obstante a jurisprudência pacífica quanto ao termo inicial dos crimes contra a ordem tributária, o Supremo Tribunal Federal tem decidido que a regra contida na Súmula Vinculante 24 pode ser mitigada de acordo com as peculiaridades do caso concreto, sendo possível dar início à persecução penal antes de encerrado o procedimento administrativo, nos casos de embaraço à fiscalização tributária ou diante de indícios da prática de outros delitos, de natureza não fiscal.[ARE 936.653 AgR, rel. min. Roberto Barroso, 1ª T, j. 24-5-2016, DJE 122 de 14-6-2016.]

A questão posta no presente writ diz respeito à possibilidade de instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do procedimento administrativo-fiscal. 2. O tema relacionado à necessidade do prévio encerramento do procedimento administrativo-fiscal para configuração dos crimes contra a ordem tributária, previstos no art. 1º da Lei 8.137/1990, já foi objeto de aceso debate perante esta Corte (...). 3. A orientação que prevaleceu foi exatamente a de considerar a necessidade do exaurimento do processo administrativo-fiscal para a caracterização do crime contra a ordem tributária (Lei 8.137/1990, art. 1º) (...). 4. Entretanto, o caso concreto apresenta uma particularidade que afasta a aplicação dos precedentes mencionados. 5. Diante da recusa da empresa em fornecer documentos indispensáveis à fiscalização da Fazenda estadual, tornou-se necessária a instauração de inquérito policial para formalizar e instrumentalizar o pedido de quebra do sigilo bancário, diligência imprescindível para a conclusão da fiscalização e, consequentemente, para a apuração de eventual débito tributário. 6. Desse modo, entendo possível a instauração de inquérito policial para apuração de crime contra a ordem tributária, antes do encerramento do processo administrativo-fiscal, quando for imprescindível para viabilizar a fiscalização.

[HC 95.443, rel. min. Ellen Gracie, 2ª T, j. 2-2-2010, DJE 30 de 19-2-2010.]

Eis a EMENTA da Decisão aqui trazida à baila, da

Turma do Superior Tribunal de Justiça - STJ

EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. MITIGAÇÃO DA SÚMULA VINCULANTE N. 24. POSSIBILIDADE. EMBARAÇO À FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA E EXISTÊNCIA DE OUTROS DELITOS CONEXOS. AGRAVOS REGIMENTAIS PROVIDOS. ORDEM CONCESSIVA REVOGADA. I. Caso em exame 1. Agravos regimentais interpostos pelo Ministério Público do Estado da Paraíba e pelo Ministério Público Federal contra decisão que concedeu a ordem de habeas corpus para trancar a Ação Penal n. 0803112-60.2020.8.15.2002 em razão de suposta violação da Súmula Vinculante n. 24 do STF. 2. Os pacientes foram denunciados por crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro e contra a ordem tributária por apurada fraude fiscal envolvendo empresas de fachada e movimentação ilícita de valores. 3. A decisão recorrida considerou que a denúncia foi oferecida antes da constituição definitiva do crédito tributário, em violação da Súmula Vinculante n. 24 do STF, e concluiu pela ausência de justa causa para a persecução penal. II. Questão em discussão 4. A questão em discussão consiste em saber se é possível mitigar a aplicação da Súmula Vinculante n. 24 do STF em casos de embaraço à fiscalização tributária e prática de outros delitos conexos, permitindo-se a persecução penal antes do encerramento do processo administrativo de constituição do crédito tributário quando presentes determinadas circunstâncias. III. Razões de decidir 5. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça admite a mitigação da Súmula Vinculante n. 24 em casos de embaraço à fiscalização tributária ou diante de indícios da prática de outros delitos de natureza não fiscal. 6. No caso, as investigações revelaram a existência de uma organização criminosa estruturada para criar empresas de fachada, dificultando a atuação do fisco e impossibilitando a identificação dos reais devedores dos tributos. 7. A denúncia descreve que houve o lançamento do crédito tributário contra as empresas fraudulentas, com inscrição em dívida ativa, atendendo aos requisitos de liquidez e certeza previstos na Súmula Vinculante n. 24. 8. A complexidade do esquema criminoso e os indícios de outros delitos conexos justificam a persecução penal, mesmo antes do encerramento do processo administrativo tributário. IV. Dispositivo e tese 9. Resultado do Julgamento: Agravo provido para revogar a decisão anterior e permitir o prosseguimento da Ação Penal n. 0803112-60.2020.8.15.2002. Tese de julgamento: 1. É possível mitigar a aplicação da Súmula Vinculante n. 24 do STF em casos de embaraço à fiscalização tributária ou diante de indícios da prática de outros delitos conexos. 2. A constituição definitiva do crédito tributário não é requisito absoluto para a persecução penal quando constatada fraude fiscal envolvendo organização criminosa que dificulta a atuação do fisco e impossibilita a identificação dos reais devedores do tributo. Dispositivos relevantes citados: Lei n. 8.137/1990, art. 1º; Lei n. 12.850/2013, art. 2º; Lei n. 9.613/1998, art. 1º; CPP, art. 41. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE n. 936.653 AgR, relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 24/5/2016; STF, HC n. 96.324, relator Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, julgado em 14/6/2011; STJ, AgRg no HC n. 551.422/PI, relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 9/6/2020. (grifamos).

ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior dando provimento ao agravo regimental, sendo acompanhado pelo Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz, por maioria, dar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Og Fernandes, que lavrará o acórdão. Votaram com o Sr. Ministro Og Fernandes os Srs. Ministros Sebastião Reis Júnior e Rogerio Schietti Cruz. Vencidos os Srs. Ministros Otávio de Almeida Toledo (Desembargador convocado do TJSP) e Antonio Saldanha Palheiro. Brasília, 02 de setembro de 2025. MINISTRO OG FERNANDES.Relator – 02/09/2025.

Do aqui trazido, podemos inferir que a aludida Súmula Vinculante nº 24 ao estabelecer que crime material contra a ordem tributária (art. 1º, I a IV, da Lei 8.137/90) só se configura após o lançamento definitivo do tributo pode ser mitigada ao permitir que a persecução penal continue antes do lançamento definitivo em circunstâncias específicas, visto que a constituição definitiva do crédito tributário não é requisito absoluto para persecução penal quando constatada, exemplificando, fraude fiscal envolvendo organização criminosa que dificulta a atuação do fisco e impossibilita a identificação dos reais devedores do tributo.

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