Marco
Aurélio Bicalho de Abreu Chagas
O
Capítulo V do Código de Processo Civil (CPC), Lei nº 13.105, de 16 de março de
2015, que trata da Responsabilidade Patrimonial, estabelece em seu artigo 789
que o devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o
cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.
Trata-se
do princípio da responsabilidade patrimonial, em que o devedor deve responder
por suas obrigações com todos os seus bens, presentes e futuros, contempladas
as ressalvas previstas em lei.
O
patrimônio, então, do devedor, se constitui numa garantia para o cumprimento de
suas dívidas, permitindo ao credor buscar a satisfação da dívida recorrendo à
penhora desses bens.
Há bens
que a lei declara impenhoráveis e que, portanto, estão fora do rol de bens
objeto de penhora
A Seção
III, do citado CPC, discorre sobre a penhora, o depósito e a avaliação e em sua
Subseção I, do objeto da penhora, enumera a ordem preferencial em que a penhora
deve observar.
Seção III
Da Penhora, do Depósito e da Avaliação
Subseção I
Do Objeto da Penhora
Art. 835. A penhora observará,
preferencialmente, a seguinte ordem:
I - dinheiro, em
espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;
II - títulos da
dívida pública da União, dos Estados e do Distrito Federal com cotação em
mercado;
III - títulos e
valores mobiliários com cotação em mercado;
IV - veículos de
via terrestre;
IX - ações e
quotas de sociedades simples e empresárias;
X - percentual do
faturamento de empresa devedora;
XI - pedras e
metais preciosos;
XII - direitos
aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária
em garantia;
§ 1º É
prioritária a penhora em dinheiro, podendo o juiz, nas demais hipóteses,
alterar a ordem prevista no caput de acordo com as circunstâncias do
caso concreto.
Foi
objeto de discussão em juízo, se é ou não possível a penhora de pontos e milhas
de programas de fidelidade.
“As
milhas são uma forma de recompensa, geralmente de companhias aéreas e
parceiros, que podem ser trocadas por benefícios com passagens aéreas, upgrades
e hotéis. Podem ser acumuladas ao voar, usar cartões de crédito ou fazer
compras em lojas parceiras de programas de fidelidade, tanto de bancos (pontos)
quanto de companhias aéreas (milhas). Entende-se que a principal diferença é
que “pontos” são mais universais e estão em programas de bancos como Livelo e
Esfera, enquanto “milhas” são específicas de programas de companhias aéreas,
como Smiles e Latam Pass.”
Em
decisão recente a 15ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São
Paulo-TJSP, no Agravo de Instrumento nº 2167605-63.2025.8.26.0000, reconheceu
natureza patrimonial desses benefícios e viabilizou conversão em dinheiro.
Em seu
voto, o Relator, asseverou:
“...é
mais do que notório o caráter patrimonial das milhas e pontos decorrentes de
programas de fidelidade sendo, inclusive, objeto de discussão em inúmeras
ações judiciais propostas pelos consumidores. Disso não há dúvidas. E diante
desse quadro, há de se reconhecer que os pontos e milhas dos programas de
fidelidade obviamente possuem valor econômico e não há impedimento à conversão
em moeda corrente. Para efeitos práticos, essas pontuações de natureza
patrimonial e creditícia são facilmente comercializadas por meio de empresas
especializadas e interessadas que atuam no ramo. Nesse viés, o art. 835,
XIII do CPC bem enfatiza a possibilidade de penhora sobre outros direitos de
titularidade do executado em atenção ao art. 789 do CPC ao determinar que o
devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento
de suas obrigações. Óbice algum existe para que as companhias aéreas
impeçam a fruição destas pontuações até porque são de titularidade do
consumidor. Apenas sobreleva pontuar que nem sempre as milhas e os pontos têm a
exata correspondência com a moeda corrente a ponto de ensejar integral
adimplemento do quantum debeatur. Por isso, plenamente possível a penhora de
milhas e pontos de programas de fidelidade na forma pretendida pela agravante.”
(grifamos)
Ilustrativamente, a seguir, a EMENTA
respectiva desse julgado:
EMENTA: Direito Processual Civil. Agravo
de instrumento. Execução de título extrajudicial. Pesquisa pontos e milhas
Programas de fidelidade. Possiblidade. Recurso provido.
I. Caso em Exame A exequente busca a
execução de título extrajudicial devido ao inadimplemento de dívida de R$
1.467.707,63, representada por contrato de câmbio. Diversas tentativas de
bloqueio de valores foram insuficientes. A exequente requereu a pesquisa e
futura penhora de pontos e milhas de programas de fidelidade dos executados, o
que foi indeferido em primeira instância. II. Questão em Discussão 2. A
questão em discussão consiste em determinar se é possível a pesquisa e
posterior penhora de pontos e milhas de programas de fidelidade como forma de
satisfazer a execução.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos
estes autos de Agravo de Instrumento nº 2167605-63.2025.8.26.0000, da Comarca
de São Paulo, em que é agravante ---------- (BRASIL) ------S/A, são agravados
------, ------ e ------. ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 15ª Câmara
de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte
decisão: Deram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do
relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos
Desembargadores ACHILE ALESINA (Presidente), MENDES PEREIRA E ELÓI ESTEVÃO
TROLY. São Paulo, 19 de agosto de 2025. (grifos da transcrição).
Do
exposto, o judiciário reconhece a possibilidade de se penhorar milhas e pontos
para a satisfação de dívidas, em processo de execução.
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